1.
Após
o fim da aula o sol se punha ocioso, provocando um alaranjado costumeiro das
tardes em Brasília. A primavera havia começado oficialmente no dia anterior e
uma chuva pesada caíra metamorfoseando o marrom predominante em um verde
imemorável.
Ela
desceu as escadas com uma destreza singular e, ao sair da escola, seguiu seu
caminho para casa. Música alta ocupava seus pensamentos quando se deparou com o
espelho enorme de um prédio empresarial, ainda molhado com um chuvisco rápido
de fim de tarde. Ficou a observar.
Enquanto
admirava seu reflexo, não pode evitar a grande porcentagem do espelho que não a
refletia e que, por sua vez, era tão diversa e envolvente, que ela se deixou
levar pelo ambedo desconcertado do
momento.
Um
espaço tão extenso. A grama, o comércio, os carros, o ônibus, as nuvens e até o
sol. Um espaço tão extenso. Todo o mundo... Bem ali... E até além dele.... O
sol. Tudo em uma superfície plana, sem profundidade alguma, refletido,
representado. Ela imaginou a distância entre a terra e o sol, e que tudo isso,
toda essa área, estava, de certa forma, sendo representada bem ali.... Bem em
sua frente.... Bem ali, num pedaço de vidro. Quase 150 milhões de quilômetros,
150 milhões... Um espaço tão extenso...
Ficou
mais alguns minutos e seguiu seu caminho. Atravessou os eixos descendo até as
quatrocentos e, durante o percurso, ao observar o ambiente, continuou sua
reflexão sobre as distâncias, os 150 milhões de quilômetros que a distanciavam
de nosso astro mais próximo, porém,
também existem distâncias extremamente pequenas, celulares, moleculares,
atômicas e até menores... Até onde as distâncias poderiam ir?
Lembrou-se
das aulas de geometria, ponto, reta, plano, conceitos tão básicas e, ao mesmo
tempo, tão intrigantes. O ponto é
infinitamente pequeno, Existem infinitos
pontos... Infinitas retas formadas por infinitos pontos... Infinitos planos
formados por infinitas retas que, por sua vez, são formadas por infinitos
pontos e assim em diante.... infinitos.... Formando todo esse espaço bem aqui,
tudo. Infinitos planos em infinitas direções bem aqui. Nas árvores, no céu, no
chão.... Em mim.... Infinitos... Nós
somos infinitos?
Perdeu
aquela noite com essa reflexão desmesurada.
~ZSett